O que é que «Dodington» e Robert Clive têm a ver com a Numisma?

 

Pouco passava da meia-noite do dia 17 de julho de 1755 quando o «Dodington», um navio inglês que se dirigia para a Índia, embateu nos rochedos situados numa ilha ao largo da África do Sul. Em 20 minutos o navio afundou-se, tendo sobrevivido apenas 23 das 270 pessoas que seguiam a bordo. Os sobreviventes viveram sete meses na ilha, hoje conhecida como Bird Island. Durante esse tempo conseguiram construir um barco que os levou a Moçambique.

A história trágica do «Dodington», propriedade de George Dodington, fundador do Banco de Inglaterra, seria igual a tantas outras que se passaram nas águas do Atlântico, especialmente junto ao Cabo da Boa Esperança, se não existisse um senhor chamado Robert Clive. O navio transportava, entre outros tesouros, 1 200 moedas de ouro portuguesas e brasileiras, que se destinavam a financiar os investimentos na Índia – Clive foi um dos obreiros do Império Britânico naquelas paragens.

Mas o que é que o «Dodington» e Robert Clive têm a ver com um leilão da Numisma? A resposta pode ser encontrada numa notícia de 28 de agosto de 2000 do jornal The Independent, de Londres. O texto fala num leilão polémico da Spink onde seriam levadas à praça as moedas do «Dodington», localizadas no final do século XX por dois mergulhadores. Polémico porque a África do Sul defendia que as moedas eram um património seu e deveriam ser devolvidas. O leilão acabaria por ser realizado em 2001, numa operação monitorizada pela UNESCO. A África do Sul recebeu 405 moedas portuguesas do «Dodington», que foram expostas num museu em Port Elizabeth.

Dois dos três exemplares hoje conhecidos da Peça 1752 de D. José I, cunhada em Lisboa, estavam a bordo do navio.

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No seu primeiro leilão de 2008, a Numisma orgulhou-se de apresentar aquela que é a segunda história mais bem guardada sobre esta moeda: o terceiro exemplar conhecido até hoje da Peça de 1752. Julgava-se que existiriam apenas duas mas há pelo menos mais uma, a qual não esteve mais de 250 anos no fundo do mar, encontrando-se em excelente estado de conservação.

Os grandes numismatas como Lopes Fernandes, (MDCCCLVII), Teixeira de Aragão, (1874), Batalha Reis (1958) e Ferraro Vaz, (1948) desconheciam a existência desta moeda.

Joaquim Ferraro Vaz, no seu livro Catálogo das Moedas Portuguesas 1640-1948, não referenciava a data de 1752. Porém, no Livro das Moedas de Portugal, dois volumes, 1969, já confirma esta data. Com certeza que este terceiro exemplar de D. José I é o mesmo que o numismata Ferraro Vaz terá tido conhecimento alguns anos antes da publicação do atrás citado.

Assim, foi graças aos dois mergulhadores que na África do Sul encontraram o «Dodington» e pelo facto de uma das moedas ter aparecido num leilão da Numisma e, simultaneamente, ter sido publicitada a sua venda que presumivelmente «fez nascer» esta moeda que vai de novo, em 2023, num leilão da Numisma – Lisboa.

O rei D. José I governou Portugal entre 1750 e 1777 mas quem mandou de facto no reino foi o seu primeiro-ministro, o Marquês de Pombal que foi fundamental na reconstrução de Lisboa logo após o terramoto de 1755, precisamente o ano em que o «Dodington» se afundou com o seu tesouro de moedas portuguesas e brasileiras.

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